quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

DAS MICROAGRESSÕES AOS CRIMES PASSIONAIS

Por: Hellen Taynan


O ciúme que você acha bonitinho no começo do relacionamento pode ser causa para sua morte mais à frente.

Há alguns dias ouvi de uma moça muito linda e jovem que se o cônjuge dela pensasse que ela o estava traindo, ele a trairia. Ora, a condição de vingança não é nem o ato, mas o pensamento de tal ato. A mesma moça me relatou como se achasse bonito o fato comum dela estar em um ambiente com algum parente e seu parceiro chegar sem avisar e passar um tempo a observando a ponto de saber o que ela consumiu naquele tempo, se levantou em algum mom

ento e com quem falou.
Esses episódios me fizeram lembrar de um artigo que lí a algum tempo sobre como são cometidos os crimes passionais.  A agressão máxima que tira a vida do ser que se julga amado, geralmente não vem como um impulso. As estatísticas mostram que não é do dia para noite que alguém que se convive lado a lado vai tirar sua vida. Antes, existe um quadro evolutivo e que proporciona essa atitude.
Aqui, não pretendo colocar a mulher como ser indefeso ou parte frágil, mas ela acaba se enquadrando como coitada quando está inserida em um relacionamento doente e mesmo com todos a sua volta avisando e ela mesma se percebendo em perigo, insiste em permanecer na relação. O discurso é sempre o mesmo e gira em torno do “eu não tenho forças”, “quem vai me sustentar?” ou, o pior, “eu preciso dele”.
Quanto a estas questões eu te digo que você tem mais força do que pensa, que pode se sustentar tanto quanto o seu companheiro consegue e que você definitivamente NÃO precisa dele para nada.
Os crimes que culminam com a morte de um dos envolvidos na relação, dão-se em estágio evolutivo. As brincadeiras de tapinhas no início do namoro evoluem para socos e ponta pés. Mas antes mesmo que se chegue a este nível, observe a evolução das micro agressões.
Primeiro as agressões começam verbais. São discussões que podem começar com diálogos aparentemente inofensivos, mas a voz se eleva cada vez mais e palavras cada vez mais baixas são proferidas. É essa a fase dos xingamentos e dos “pingos nos ís”. O problema é que quase nunca os pingos são colocados suficientemente e aí vem a segunda fase.
Na segunda fase, as agressões por xingamento não suprem mais e por mais que o rumo seja à exaustão, as palavras baixas vão se tornando insuficientes. Agora se têm as agressões psicológicas. Um agride o outro naquilo que lhe é mais sensível. A parte que detém o domínio na discussão manipula o outro e faz sentir sujo, culpado, diminuído... Nesta fase também cria-se no outro a falsa ideia de dependência. Você é convencida de que sozinha não é ninguém e que não vai conseguir e que precisa dele para estar bem, para se sentir segura, para se sustentar financeiramente. Assim, quando o domínio psicológico é concretizado, quando o outro é menosprezado e encontra-se nas mãos do agressor, as palavras não bastam e então vem a terceira fase.
A terceira fase é a agressão física. Após os xingamentos e o derrame de todas as palavras capazes de diminuir o outro ao último grau de um ser humano, ou até arrastá-lo para mais baixo que isso, as micro agressões evoluem à agressão física. Tapas, empurrões, ponta pés, socos e ameaças de morte. Chantagens e exigências de que as coisas sejam do jeito que ele quer. Ele passa a responsabilizar você de tudo. Logo, se você apanha é porque provocou e se acontecer algo com ele e ele for denunciado ou preso, você será culpada e ele fará você pagar por isso.
Enfim, a quarta e última fase é a consumação do crime. Todas as fases anteriores se esgotaram e nada mais supre o descarregar do ódio a não ser, tirar a vida do outro. Apesar dos crimes passionais serem movidos a picos de grandes emoções, os episódios não são impulsivos. São planejados e até avisados muito tempo antes de acontecer.
Crimes passionais, em sua maioria, são tragédias anunciadas. Em pleno século XXI, ainda é comum ouvir mulheres se queixando de machismo, quando na verdade elas próprias são machistas quando se sujeitam às micro agressões e defendem seu parceiro como podem das atrocidades que ele comete.

É muito triste sentir-se impotente diante de situações como essa. Por mais que se avise e que se mostre caminhos de fuga para a pessoa que é vítima das micro agressões, na maioria das vezes ela encontra-se numa teia, na qual, aquele que tenta livrá-la, em sua concepção, faz o mal e aquele agressor que a prende, quer sempre o melhor para ela.

Publicado em: Jornal de Caruaru

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