terça-feira, 10 de setembro de 2019

CEDO OU TARDE?


Quando decidi levar a sério o curso de Administração e seguir carreira acadêmica, pensei no que a disciplina poderia me oferecer de mais flexível, criativo, inovador e ousado. Um mea culpa de desinteresse com uma pitada de pouca didática de alguns docentes, coloquei Marketing como o campo que poderia suprir minhas expectativas.

Nas primeiras semanas como aluna de optativas no mestrado na Paraíba, ressignifiquei a Administração em minha vida. Foi muito rápida a forma como o curso que eu havia escolhido começou a fazer todo sentido para mim. Logo eu estava tendo contato com a obra de Guerreiro Ramos, Habermas, Bourdieu, Baudrillard, Latour e com todas as conexões filosóficas que motivaram as teorias desses pensadores. Só havia um pequeno problema nisso tudo... Eles não "conversavam" com o que se estudava no Marketing.

A linha na qual eu estudava recebia o título Marketing e Sociedade. A isto me orgulho do pioneirismo da Paraíba. Porém, muitas das ideias que eu levava eram tidas como "incomensuráveis", por assim dizer. E por quantas vezes eu não ouvi coisas como: "ok, mas cadê a Administração aí?"
Ou "entendi, mas isso é Sociologia, não Marketing". 

Passei muitas noites sem dormir procurando uma teoria no marketing que me permitisse "encaixar" minhas ideias e enfim encontrei. Alguns consideram minha dissertação uma "salada epistemológica". Contudo, não são para estes que escrevi. Mas é neste ponto, que começo a pensar se é tarde demais e eu que escolhi erroneamente o marketing; ou se cheguei cedo demais a um pensamento que não cabe na época e que propõe tecer linhas interdisciplinares maiores que os pontos que as encerram e as tornam incomunicáveis.

Um professor na Paraíba dizia que não era todo mundo que acompanhava meu raciocínio e que eu teria problemas com grandes pesquisadores de mentes pequenas. Eu tomava isso com suspeição de alguém que fala por admirar algumas de minhas características que não são tão boas assim e na verdade mais me constrangem do que animam. Apenas hoje eu tenho maturidade para entender o que este professor queria dizer.

No doutorado em terras mineiras, fui apresentada a outros personagens encantadores a exemplo de Foucault, Weick, Deleuze e Guattari, que novamente me colocam no desafio de pensar como estes poderiam conversar com o marketing? E eu estou convicta de que há possibilidades e que eu tenho a capacidade de estabelecer estes diálogos. 

Porém, consigo com um só texto ser rejeitada em todos os campos!

Não basta apenas afastar a ideia micro de mercadologia do marketing quando a visão acadêmica muitas vezes está presa a esta ideia. Se para mim - e para alguns - é tão óbvia a proximidade entre os campos, para a maior parte da Academia, não. 

Em minhas duas experiências, tive a felicidade de ter orientadores que estão dispostos a ouvir minhas angústias e tentar ao meu lado buscar soluções para as dores epistêmicas que por vezes me afetam. Mas por hora tais angústias persistem. Elas surgem, por exemplo, quando recebo o parecer de uma revista do marketing pedindo que eu escolha se vou utilizar uma teoria do marketing ou uma teoria dos estudos sociais, como aconteceu hoje.

Se sei que sou apenas um grão de areia num espaço de rochas fortes e grandes, também sei que não estou sozinha e existem muitos grãos se condensando para um dia fazer diferença. Afinal, ninguém nasce grande.

Quando penso sobre ser tarde ou cedo demais, os agenciamentos fazem-me pensar pluralmente. Uma linha leva ao arrependimento e o não poder recomeçar. Outra conduz a pensar que tudo está exatamente no momento que deveria estar. Ainda é cedo. E em mim são tantos eus que oscilam e se desafiam. Eus que se sobrepõem e fazem da força, que me obriga ser uma, uma vontade de potência que me permite ser muitas.

Hellen Taynan

10/09/2019
20:19


Um comentário:

Unknown disse...

Grupos, pessoas, ideias, "donos" de verdades... até que alguém surge e afronta as idéias... veja o mito da caverna... Galileu Galilei, Jesus Cristo, e outros anonimos que "ousam" os pensadores que pensam... grupos,pessoas e ideias que se renovam... fora da caverna tem vida!