A quarta-feira hoje bem que poderia
ser de cinzas. Eu não gosto de carnavais, mas se a gente pensar poeticamente, o
romantismo pode nos fazer ver que o carnaval também representa castelos de
sonhos e fantasias onde tudo é permitido, onde a imaginação nos transporta ao
céu e ao inferno. Onde as duas portas que determinam o nosso destino se abrem e
um julgamento cheio de amor e compaixão nos concede uma nova oportunidade.
Era assim que Ariano via, não?
Uma mente privilegiada e uma vida bem vivida! Bem-vivida não só pelos seus 87
anos de lucidez. Bem-vivida não só pelos laços familiares que construiu. Mas
bem-vivida, acima de tudo, porque levou em seus ombros suas origens. Valorizou
sua história. Foi paraibano, foi pernambucano, falou “OXENTE” até o último dia!
E, com certeza, até o último dia, conseguiu ser querido por alguém através de
sua simplicidade e sua humildade.
Ariano tinha quase tudo para ser tudo.
Mas ele preferiu não ser tudo, porque tudo engloba a soberba, a ganância e a arrogância.
Isso não cabia nele. Um coração humilde, que certa vez, em uma Aula Magna na
UFPE, onde tive o prazer de conhecê-lo, contar-lhe minha paixão por seu estilo
literário e tirar algumas fotos, e de todo o luxo digno que uma personalidade
do seu quilate poderia exigir, tudo o que ele pediu foi água de coco, cadeira e
mesa.
No dia em que ele sofreu o AVC,
ele foi ter com o Grande Juiz. A audiência acabou hoje. Não havia Chicó no
hospital para tocar a flauta e trazê-lo à vida. Ou talvez, Chicó tocou a flauta
lá em cima mesmo e por lá ele ficou. A doce e romântica esperança de que não
acabou aqui deve acalentar nosso coração neste momento de luto.
Saber que Deus é sábio o
suficiente para não permitir que uma mente tão brilhante pare com a última
batida do coração. Aliás, tenho desconfianças de que estão mesmo precisando de
bons escritores e pensadores no céu (talvez seja até por isso que eu ainda estou
aqui escrevendo)...
Ariano Suassuna, cumpriu sua
sentença. Aquele fato sem explicação que iguala tudo o que é vivo. Mas a sua
sentença na Terra era ser imortal e ele estará sempre vivo, na Academia, nos
seus livros e nos seus personagens. Vai em paz, Ariano! E que essa geração
NUNCA deixe que as próximas que virão esqueçam você.
Com todo o sentimento,
Hellen Taynan
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